A poesia abaixo é uma das poesias de Cláudio Manuel (1729-1789), grande poeta árcade brasileiro.
“Destes penhascos fez a natureza
O berço, em que nasci! oh quem cuidara,
Que entre penhas tão duras se criara
Uma alma terna, um peito sem dureza!
Amor, que vence os tigre por empresa
Tomou logo render-me; ele declara
Contra o meu coração guerra tão rara,
Que não me foi bastante a fortaleza.
Por mais que eu mesmo conhecesse o dano,
A que dava ocasião minha brandura,
Nunca pude fugir ao cego engano:
Vós, que ostentais a condição mais dura,
Temei, penhas, temei; que Amor tirano,
O berço, em que nasci! oh quem cuidara,
Que entre penhas tão duras se criara
Uma alma terna, um peito sem dureza!
Amor, que vence os tigre por empresa
Tomou logo render-me; ele declara
Contra o meu coração guerra tão rara,
Que não me foi bastante a fortaleza.
Por mais que eu mesmo conhecesse o dano,
A que dava ocasião minha brandura,
Nunca pude fugir ao cego engano:
Vós, que ostentais a condição mais dura,
Temei, penhas, temei; que Amor tirano,
Onde há mais resistência, mais se apura.”
(COSTA, Claudio
Manuel da)
ANALISE
Cláudio Manuel da Costa (1729-1789) fazia parte de uma
classe de brasileiros típica do século XVIII no Brasil. Estudou em Coimbra,
Portugal, e por isso possuía sólida formação cultural e intelectual. Enquanto esteve
estudando pela Europa, mesmo com a forte influência do Barroco, conheceu o
Arcadismo português e apreciou o seu aspecto inovador. Antes de retornar ao
Brasil, passou pela Itália, onde se ingressou na Academia dos Árcades de Roma,
estudou italiano e produziu cantatas e sonetos nesta língua.
Ao voltar para Vila Rica (Minas
Gerais), exerceu muitos cargos de importância na cidade. Claudio Manuel foi um
referencial para os poetas brasileiros, grandes leitores de suas obras, por ser
respeitado como intelectual e figura pública. Sua casa era um local de encontro
entre alguns desses poetas, chegando até a fundar, em 1768, uma Arcádia com
nome de Colônia Ultramarina. Viveu cercado de poetas, religiosos, militares de
patente alta e outras pessoas. É provável que conversas sobre a Inconfidência
Mineira tenha ocorrido em sua casa.
A publicação de suas obras é o marco
inicial do Arcadismo brasileiro, o
que revela a sua grande importância no contexto de produção desse tipo de
poesia no Brasil. Publicada em 1768, a obra trata de elementos da paisagem
irregular da região de Vila Rica e Mariana. Pedras, serras e montanhas misturam-se
com imagens de convenção árcade, como ninfas (vindas da cultura greco-romana,
retomadas no iluminismo), pastores e gado. A natureza se torna real e simbólica
ao mesmo tempo.
O poema apresentado acima mostra uma
identificação do eu lírico com a natureza ao seu redor. Na briga entre penhas
(pedras) e alma, podemos ver uma das leituras possíveis do poema: a construção
de uma personalidade dividida entre a sensibilidade e a dureza. É essa procura
de identidade, sempre relacionada à paisagem envolta do eu lírico, que faz com
que a poesia de Claudio Manuel da Costa seja tão específica do Arcadismo
brasileiro.
Por Miguel Botelho
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